Câncer de próstata: quando o rastreamento é indicado?

Entre os fatores que aumentam o risco para o câncer de próstata, estão a idade (a partir dos 60 anos), histórico da doença da família, herança genética e raça negra. Nesses grupos mais propensos a desenvolver o tumor, o rastreamento com exames clínicos e laboratoriais é essencial para aumentar as chances de diagnóstico precoce e, consequentemente, sucesso no tratamento.

O rastreamento do câncer de próstata é feito através do toque retal e do exame de sangue para avaliar a dosagem do PSA (antígeno prostático específico). Essa é uma proteína produzida pela próstata que, em níveis elevados, pode indicar alguma doença na glândula, incluindo o câncer.

“O recomendado é que homens a partir de 50 anos busquem avaliação especializada para o rastreamento do câncer de próstata. Para homens negros ou com histórico familiar da doença, o rastreio deve ser iniciado aos 45 anos”, explica Charles Kelson Aquino, urologista da Hapvida Notredame Intermédica, à CNN.

Além do toque retal e da dosagem do PSA no sangue, também podem ser incluídos no rastreamento exames como ultrassom da próstata e ressonância magnética, segundo Aquino. A confirmação do diagnóstico é feita através da biópsia da próstata por via trans-retal ou trans-perineal, guiada por exames de imagem.

Ministério da Saúde e OMS não recomendam rastreamento para população geral; especialista faz ressalva

O Ministério da Saúde, assim como a Organização Mundial da Saúde (OMS), não recomenda que o rastreamento do câncer de próstata seja feito em homens que não têm maior risco para a doença e que não apresentam sintomas. Segundo essas entidades, não há evidência científica de que o rastreamento traga mais benefícios do que riscos.

A orientação da pasta gera discussão na área de oncologia e urologia. “Essa recomendação foi inspirada no órgão americano US Preventive Task Force, que orientava o não rastreamento do câncer de próstata. O argumento é que grande parte dos homens naquele país diagnosticam a doença em estágio localizado, sem metástase, e, consequentemente, o diagnóstico não teria impacto na melhora da sobrevida dos pacientes”, explica Bruno Benigno, urologista e oncologista do Hospital Oswaldo Cruz e diretor da Clínica Uro Onco.

No entanto, o especialista alerta que a realidade brasileira é outra. “Transportar esses dados para nosso país não faz sentido, uma vez que vivemos, ainda, uma dificuldade de acesso e rastreamento”, afirma.

Benigno explica que, segundo dados do próprio Instituto Nacional do Câncer (Inca), 30% a 35% dos brasileiros já descobrem o câncer de próstata em estágio avançado.

“Ou seja, são casos que poderiam ter sido detectados anteriormente se nós tivéssemos um programa de rastreamento populacional mais cedo”, argumenta o urologista. “Na minha opinião, não fazer o rastreamento populacional em homens brasileiros pode trazer um risco ainda maior da parcela da população que descobre a doença avançada”, completa.

Foi o que aconteceu nos Estados Unidos em 2018, quando as diretrizes foram atualizadas para recomendar que homens discutam com seus médicos sobre o rastreamento do câncer de próstata entre os 55 e 69 anos. Dessa forma, é reconhecido que a decisão final sobre fazer ou não o rastreamento deve ser individualizada e baseada nas preferências do paciente, considerando potenciais riscos e benefícios. O mesmo é feito no Reino Unido.

A Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC), de Urologia (SBU) e de Radioterapia (SBRT) seguem o mesmo raciocínio e recomendam que seja discutido individualmente o rastreamento considerado que a doença é assintomática (ou seja, não apresenta sintomas) em suas fases iniciais.

Em posicionamento assinado em conjunto, as sociedades recomendam a discussão sobre potenciais riscos e benefícios do rastreamento do câncer de próstata com PSA. “Essa discussão deve também envolver a possibilidade do diagnóstico de tumores de próstata indolentes ou que não necessitam de tratamento imediato; possíveis riscos relacionados aos tratamentos e aos impactos negativos na qualidade de vida”, diz a nota.

Dessa forma, o que considerar para iniciar o rastreamento?

Diante das diferentes posições sobre o rastreamento, ouvir a opinião e recomendação do médico urologista é fundamental. Isso porque, independentemente de ter risco aumentado ou não para o câncer de próstata, o diagnóstico precoce é fundamental para o sucesso do tratamento e maior probabilidade de cura.

“Se por um lado se discute o excesso eventual de exames ou procedimentos, por outro lado, há o fantasma da doença avançada”, pondera Aquino. “Na fase avançada do câncer de próstata, o paciente pode apresentar uma série de sintomas debilitantes. As dores intensas e de difícil controle são comuns, especialmente dores pélvicas e dores associadas à micção. A obstrução miccional pode ocorrer, levando à necessidade de uso de sonda uretral ou à realização de uma cistostomia [procedimento cirúrgico que cria uma abertura na bexiga].”

Além disso, no câncer de próstata avançado, pode haver sangramento urinário, dor no reto e dor óssea.

“O fim da vida de um paciente com câncer de próstata terminal é muitas vezes triste, sendo um processo lento e sofrido tanto para o paciente quanto para a família”, considera Aquino. “A minha opinião — e, acredito, que a de muitos urologistas — é de que o tempo irá comprovar, como tem sido sugerido em tantos trabalhos recentes, que, mesmo com algum risco de excessos na medicina, a avaliação preventiva faz mais sentido e diminui os riscos de um câncer avançado”, afirma.

Benigno lembra, ainda, que o diagnóstico precoce, feito através do rastreamento, pode reduzir as chances de sequelas no tratamento. “Quando o câncer de próstata é localizado, ele ainda não teve tempo de infiltrar o esfíncter urinário e os nervos da ereção, que ficam fora da próstata. Portanto, também os riscos de sequelas, de perda da ereção e de incontinência urinária, que podem estar relacionados ao tratamento, são menores”, afirma.

O especialista ressalta também que a consulta regular com médico urologista não serve apenas para avaliar a saúde da próstata, mas, sim, a saúde do homem como um todo.

“Nós sempre vamos abordar a saúde do homem de forma geral, qualidade do sono, atividade física, alimentação, se o paciente tem sobrepeso, estimular o paciente a parar de fumar, enfim, e também avaliar os sintomas urinários, como jato fraco, incontinência urinária, risco de câncer de próstata e questões relacionadas à ereção. Portanto, o rastreamento não é um momento focado apenas para a saúde da próstata, e sim para a saúde do homem como um todo, e é por isso que eu acho que é importante, sim, mantermos as campanhas de rastreamento”, finaliza.

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